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Inquérito Policial Militar e a Denúncia Anônima

Inquérito Policial Militar e a Denúncia Anônima

É possível a instauração da inquisa somente com base em denuncia anônima?

Em âmbito de inquérito policial militar, o artigo 10 elenca quais os modos que o IPM pode ser instaurado. Diante da notitia criminis (que é a noticia do crime), a autoridade competente irá instaurar o IPM para apurar os indícios suficientes de autoria e a prova da materialidade delitiva.

  A denuncia anônima ou delação anônima é uma forma de notitia criminis. A doutrina classifica esta noticia como sendo uma notitia criminis inqualificada. O próprio Código de Processo Penal Militar prevê que uma das formas de instauração da inquisa ocorra mediante o requerimento da parte ofendida, de seu representante legal ou por representação do cidadão que conheceu da infração penal militar. Esta é uma situação em que a denuncia anônima pode estar presente.

Quando estudamos este tema o que tem que ser observado em primeiro lugar é o mandamento constitucional que veda o anonimato. A previsão está contida na CF, artigo 5º, inciso IV: “é livre a manifestação de pensamento, sendo vedado o anonimato”. Esta vedação existe, visto que a liberdade de expressão não pode ser exercida de forma absoluta, sem limites ou controles.

Se a autoridade entender que é caso de instauração de IPM, mesmo que se conclua pela atipicidade da conduta praticada, não poderá arquivar o IPM

No entanto, do mesmo jeito em que é a preservada a imagem e honra de uma pessoa, sendo estes os principais motivos pelos quais se veda o anonimato, outros direitos podem estar em colisão. Sendo assim vigora em nosso ordenamento jurídico o principio da proporcionalidade, visto que não existem no ordenamento jurídico direitos absolutos (nem a vida o é, diante da previsão de sua aplicação nos moldes do Código Penal Militar).

Diante da noticia de pratica de uma infração penal, a autoridade policial militar não está obrigada a instaurar de maneira automática um IPM, devendo verificar antes a procedência das informações. Por isso a jurisprudência tem admitido que a autoridade instaure, em caso de fragilidade destas primeiras informações, o procedimento chamado de verificação de procedência de informação (VPI). Se a autoridade entender que é caso de instauração de IPM, mesmo que se conclua pela atipicidade da conduta praticada, não poderá arquivar o IPM, devendo fazer a remessa ao titular da ação penal militar que se assim entender fará a devida promoção de arquivamento.           

Mas e com relação a denuncia anônima? O que deve fazer a autoridade policial militar? Deve instaurar de plano o inquérito policial militar ou deve adotar alguma outra providência preliminar, tal como a verificação de procedência de informação?

Esta é uma indagação muito interessante, visto que diante da conduta supostamente praticada pelo militar (seja das Forças Armadas ou das Forças Auxiliares), poderá estar enquadrada como transgressão disciplinar. Por exemplo: aporta na Administração Militar uma denuncia anônima informando que determinado militar das Forças Armadas ou policial militar está exercendo atividade renumerada estranha às funções militares. Esta conduta é prevista em todos os regulamentos disciplinares como transgressão (a gravidade da conduta dependerá de cada regulamento em si). Ora, diante desta noticia criminis inqualificada, a autoridade policial militar deve arquivar o expediente e remeter para a via administrativa.      

  Mas sendo atribuída a suposta pratica de um crime militar, a delação anônima deve ser averiguada preliminarmente antes da instauração da inquisa. No Estado de São Paulo, por exemplo, o instrumento correlato utilizado pela Policia Militar é a investigação preliminar. O Ministério Publico da União se utiliza a noticia do fato.

De qualquer modo a autoridade tem que ter a cautela de verificar se existem elementos mínimos para a instauração do procedimento administrativo, visto que se inexistirem e mesmo assim for indevidamente instaurado, poderá ser impetrado HC visando o seu trancamento.

A denuncia anônima apenas pode acarretar a instauração do inquérito policial quando corroborada por elementos colhidos em investigações preliminares

O STJ no julgamento do HC n. 199086/SP, tendo como relator o Min. Jorge Mussi, decidiu que “é pacifica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a denuncia anônima apenas pode acarretar a instauração do inquérito policial quando corroborada por elementos colhidos em investigações preliminares”.

O Superior Tribunal Militar também adotou este mesmo entendimento, conforme podemos verificar no julgamento do HC n.º 2005.01.034035/PR, que teve como relator o MIn. Carlos Alberto Marques Soares: “Procedimento inquisitorial. Instauração mediante requisição do Ministério Publico Militar. Origem, denuncias relatadas mediante carta anônima. Vedação ante a Constituição federal/88. Demais provas contraditórias – Militar oficial denunciado como incurso no artigo 174 (…) do CPM (Rigor Excessivo)… Controvérsias na descrição dos fatos imputados ao paciente. Negativa de autoria por parte do mencionado oficial, cujas alterações militares são repletas de elogios. Depoimentos das “pseudovitimas” contraditórios. Flagrante constrangimento ilegal (…) trancamento da ação penal.”

Simplificando o tema, a autoridade policial militar somente deve instaurar o inquérito policial militar após a devida constatação de verosimilhança do conteúdo da denuncia anônima, sob pena de ver trancada a inquisa por falta de justa causa. 

Prof.ª Dra. Fernanda Gonçalves

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