Direito Penal Militar

ABANDONO DE POSTO É SINÔMINO DE AFASTAMENTO DE POSTO?

A linha entre o abandono do posto e afastamento do posto é muito tênue

O crime de abandono de posto está previsto no Capítulo III – “Do Abandono de Posto ou de Outros Crimes em Serviço”, do Titulo III – “Dos Crimes Contra o Serviço Militar e o Dever Militar”, do Livro I – “Dos Crimes Militares em Tempo de Paz.” do Código Penal Militar.

Determina o artigo 195, in litteris: “Abandonar, sem ordem superior, o posto ou lugar de serviço que lhe tenha sido designado, ou o serviço que lhe cumpria, antes de terminá-lo. Pena – detenção, de três meses a um ano.” 

A objetividade jurídica, o interesse que é tutelado pela norma penal militar é o serviço militar / dever militar.

Este crime pode ser classificado como:

  • Propriamente militar (com supedâneo na classificação do artigo 9º, inciso I do CPM), só podendo ser praticado por militares. Se o civil praticar tal conduta ela será atípica;
  • Crime de mão próprio – não admite co-autoria. O núcleo do tipo só pode ser praticado pelo militar;
  • Crime de mera conduta – não possui resultado, a conduta do agente em abandonar o posto ou o local de serviço por si só já configura o crime, independentemente da produção de resultado;
  • Crime de perigo – não necessita ter a comprovação do dano;
  • Doloso – o abandono do serviço tem que ser intencional, bem como sua vontade de violar o serviço e o dever funcional. Não admite a modalidade culposa;
  • Unissubsistente – é formado por um só ato, não admitindo tentativa. Ou o militar abandona o posto e o crime estará consumado, ou não o faz e neste caso será um indiferente penal.

Portanto, abandono do posto é crime militar. Mas e se afastar do posto? É a mesma conduta? A resposta é negativa. A conduta do militar em se afastar do posto é considerada uma transgressão disciplinar.

Se o militar abandonar o posto estará incorrendo em crime militar e responderá penal e administrativa por esta conduta, mas, por seu turno, se ocorrer somente o afastamento, a conduta será penalmente atípica e sua responsabilidade se revolverá somente na seara administrativa. 

  O Regulamento Disciplinar da Policia Militar do Estado de São Paulo – RDPM prevê como transgressão disciplinar em seu artigo 13, itens 74 e 77, tal conduta, respectivamente: “abandonar serviço para o qual tenha sido designado ou recusar-se a executá-lo na forma determinada” e “afastar-se, quando em atividade policial-militar com veículo automotor, aeronave, embarcação ou a pé, da área em que deveria permanecer ou não cumprir roteiro de patrulhamento predeterminado”. Ambas as transgressões disciplinares são de natureza grave, o que autoriza, em tese, a aplicação das penalidades de demissão e expulsão do policial das fileiras militares.

A linha entre o abandono do posto e afastamento do posto é muito tênue, inclusive o RDPM faz menção as duas expressões, tratando-as de forma idêntica quanto de suas conseqüências (são de natureza grave).

A doutrina costuma apontar o seguinte critério para diferenciar uma conduta da outra, tendo em vista que existem situações fronteiriças: se o militar abandona o posto, mas permanece por perto, mantendo de alguma forma vigilância inequívoca sobre o posto sob sua responsabilidade, podendo prontamente intervir se preciso for, esta conduta é atípica penalmente, sendo caracterizada como afastamento e não abandono.

Esse também é o entendimento da Jurisprudência, que defende que a manutenção da vigilância sobre o posto ou local do serviço é um critério hábil a ser utilizado para afastar a incidência do crime.    

Portanto, se o militar abandonar o posto, mas ficar em uma posição que lhe permita intervir satisfatoriamente se necessário for, a conduta será considerada como transgressão disciplinar, não importando o nome que se dê, seja abandono ou afastamento.  

Com relação aos Regulamentos Disciplinares das Forças Armadas encontramos as seguintes transgressões disciplinares:

  • REGULAMENTO DISCIPLINAR DO EXERCITO – R4 (Decreto 4346/2002): item 28 do anexo I – “Ausentar-se, sem a devida autorização, da sede da organização militar onde serve, do local do serviço ou de outro qualquer em que deva encontrar-se por força de disposição legal ou ordem”;
  • REGULAMENTO DISCIPLINAR DA MARINHA – Decreto 88.545/83: artigo 7º, item 53: “Ausentar-se sem a devida autorização da Organização Militar onde deva permanecer”;
  • REGULAMENTO DISCIPLINAR DA AERONAUTICA – Decreto
  • 322/75: artigo 10, item 19: “Abandonar o serviço para o qual tenha sido designado.”

Dra. Fernanda Gonçalves – OAB/SP 231.759
fernanda.dra@adv.oabsp.org.br
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