DELITO DO SONO É transgressão disciplinar ou crime militar?
O delito do sono também é conhecido pela conduta do militar dormir em serviço. Existe previsão tanto no Código Penal Militar quanto no Regulamento Disciplinar da Policia Militar do Estado de São Paulo (LC n.º 893/2001).
Determina o artigo 203 do Código Penal Militar:
“Dormir o militar, quando em serviço, como oficial de quarto ou de ronda, ou em situação equivalente, ou, não sendo oficial, em serviço de sentinela, vigia, plantão às maquinas, ao leme, de ronda ou em qualquer serviço de natureza semelhante. Pena – detenção, de três meses a um ano.”
A objetividade jurídica, ou seja, o interesse que é tutelado pela norma é o serviço militar / dever militar. Sua relação é com a segurança das Instituições Militares.
Este crime pode ser classificado como:
Propriamente militar (com supedâneo na classificação do artigo 9º, inciso I do CPM);
De mera conduta – o legislador descreve a conduta não exigindo a produção de resultado, visto que basta para a sua configuração apenas a omissão do dever de permanecer acordado;
Doloso – a conduta do militar de dormir em serviço tem que ser intencional, bem como sua vontade de violar o serviço e o dever funcional.
O tipo penal diferencia as situações em que o Oficial ou a Praça podem cometer o crime, inclusive pode ser cometido tanto nas atividades operacionais quanto nas administrativas. O Oficial pode praticar o crime nas atividades de ronda ou como oficial de quarto. Já o Praça quando exercer atividades de sentinela, vigia, plantão às máquinas, ao leme, de ronda ou qualquer serviço de natureza semelhante.
É importante fazer uma observação com relação ao crime. Este é previsto somente na forma dolosa, ou seja, se o militar adormecer culposamente (por exemplo: se ingerir comprimidos para dor e lhe causar uma sonolência irresistível) sua conduta estará caracterizada como transgressão disciplinar, resolvendo-se assim no âmbito administrativo.
Por seu turno o Regulamento Disciplinar da Policia Militar do Estado de São Paulo – RDPM prevê como transgressão disciplinar em seu artigo 13, itens 85 e 86, tal conduta, respectivamente: “dormir em serviço de policiamento, vigilância ou segurança de pessoas ou instalações” (É uma transgressão disciplinar de natureza grave, que autoriza inclusive a demissão ou expulsão do militar) e “dormir em serviço, salvo quando autorizado.” (Transgressão disciplinar de natureza média.)
O tema de maior relevância é saber quando dormir em serviço será considerado crime militar ou transgressão disciplinar. Lembrando que não há de se falar em dupla punição pelo mesmo fato, face ao princípio de independência de instâncias.
Analisando os tipos concluímos que a previsão contida no RDPM é mais ampla do que a contida no Código Penal Militar (este último somente especifica situações determinadas para o Oficial e para o Praça). Isso ocorre porque em sede de punição administrativa não precisa se verificar o dolo ou a culpa do militar, ao passo que no caso da pratica de crime militar, a conduta é somente dolosa.
Podemos concluir desta forma que se o militar dormir durante o expediente de sua Unidade militar, mas não estando em atividade de ronda ou qualquer outra descrita no artigo 203 do Código Penal Militar, sua conduta será caracterizada como transgressão disciplinar, podemos citar como exemplo o militar dormir durante a instrução ou em sala de aula.
Destarte, dormir em serviço é um crime doloso e sua ocorrência também pode caracterizar uma transgressão disciplinar (nestes casos o militar responde penal e administrativamente, de forma cumulativa), ou, se a prática ocorrer fora das hipóteses previstas no Código Penal Militar ou ainda se o militar adormecer culposamente, sua conduta será apurada somente no âmbito administrativo.
Dra. Fernanda Gonçalves – OAB/SP 231.759
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